A lei do reporto e sua aplicação para os supermercados parece gerar uma série de dúvidas, insegurança, e as vezes até mesmo uma certa dose de alarmismo, especialmente quando se trata do ramo varejista, e supermercados é um deles. Contudo, pode-se supor que não passa, em verdade, de incompreensão do que de fato é um intrincado encadeamento de lei, entendimento jurisprudencial e normas de contabilidade. De fato, existem hipóteses na qual as vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência, não permitirão a manutenção dos correspondentes créditos, em casos em que a lei expressamente vedar, conforme tese “03”, do tema 1093, do STJ.
Nesse caso, vale relembrar que nós da WHM publicamos uma análise sumária do desfecho do julgamento do tema 1093 essencial para auxiliar na compreensão do presente ensaio, e pode ser conferido no link ao final do texto[1]. Naquele texto é possível compreender que o enfoque da Corte foi o alargamento do aproveitamento de créditos originados em produtos monofásicos. Naquela ocasião alertamos ainda para o fato de que a Lei Federal 11.033/2004, com intepretação conferida no tema 1093, do STJ, especialmente em relação ao art. 17, da lei 11.033/2004, autorizou a possibilidade de manutenção dos créditos das referidas contribuições pelo vendedor (atacadistas/varejistas) nas vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência, conforme tese “02”, do repetitivo.
E no mesmo julgamento, a Corte afastou a possibilidade de manutenção dos créditos das contribuições ao Pis e ao Pasep, pelo vendedor (atacadistas/varejistas) nas vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência. E nesse caso é preciso se concentrar no próprio julgado, nos votos e na conclusão para perceber que o foco da Corte foi solver o alargamento da aplicação do art. 17, da lei 11.033/2004. Os setores de revenda de combustíveis carburantes (postos de combustíveis), toucadores (farmácia) e supermercados faziam o “aproveitamento” do crédito originado em produtos sujeitos a monofosia. E esse foi o enfoque da Corte. Na ótica da WHM a tese fixada foi correta em suas conclusões porque, contabilmente, não fazia sentido reconhecer um crédito tributário, de uma operação que sequer foi oferecida a tributação, ou que será no futuro.
Reside, contudo, no imaginário de alguns contribuintes e até mesmo de algumas assessorias, a dúvida quanto a aplicação do art. 17, da lei 10.833/2004 para beneficiar os supermercadistas. Nesse caso, é preciso de antemão compreender que juridicamente supermercados são revendedores varejistas assim como uma série de outros ramos. E é claro que em razão na natureza dos bens revendidos, existem uma vasta lista de bens sujeitos à tributação monofásica, isento, alíquota zero ou não sujeito a tributação de Pis e da Cofins, seja na fabricação ou mesmo na revenda. Contudo, existem outros bens sujeitos à tributação plurifásica, cujas vendas ao consumidor final e somente elas são efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência. Nesse caso, o tema 1093 ao fixar na tese “03”, com a seguinte redação “O art. 17, da Lei 11.033/2004, diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor, portanto não permite a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica, já que vedada pelos arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003”, é permissivo de manutenção de créditos nas hipóteses em que lei não veda.
E para ir ainda mais adiante, é preciso salientar que o julgamento frisa de modo bem específico, e exemplifica a vedação para as hipóteses da monofosia, que era justamente o cerne daquele julgamento. O julgamento combateu o entendimento que a WHM sempre considerou equivocado. O entendimento equivocado, de muitos, era o de que as contribuições sociais previstas nas Leis Federais 10.637/2002 e 10.833/2003 previam a sistemática da não cumulatividade. E, nesse caso, pela aplicação do art. 17, da Lei Federal 11.033/2004 (reporto), buscava-se sustentar que os créditos poderiam ser apurados e mantidos, ainda que se trata-se de incidência monofásica por crédito presumido. Essa tese tinha intepretação análoga tal como pode ocorrer no IPI para exportação.
Mas o que diz a norma? As leis federais 10.637/2002 e 10.833/2003 vedam, em seus respectivos incisos II, §2º, art. 3º, com a seguinte redação: “[...] § 2o Não dará direito a crédito o valor: [...] II - da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição [...]”. Veja-se que a norma é clara e evidente quanto a vedação do direito creditório, nas hipóteses nas quais a própria aquisição não foi sujeita de tributação, exatamente como no caso do monofásico. À medida que o art. 17, da lei federal 11.033/2004 teve sua aplicação confirmada para outras atividades sujeitas ao regime não cumulativo, das contribuições ao Pis e ao Pasep, não há dúvida de que as aquisições tributadas, e revendidas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência, o entendimento emanado no tema 1093 permite a manutenção desses créditos.
Mais: ainda de acordo com a tese firmada, a possibilidade de creditamento se prende aos bens, e não a pessoa jurídica, o que permite, inclsuive, a manutenção de créditos de insumos que tenham sido tributados pela sistemática monofásica, mas que foram transformados e passaram a ser um produto inteiramente novo. Se esse bem inteiramente não estiver sujeito a incidência monofásica, ainda que a venda se dê com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência da contribuição para o Pis/Pasep e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações.
Portanto, a ideia de que os supermercados não podem se beneficiar do art. 17, da lei federal 11.033/2004, não tem aderência com a realidade jurídica, até porque este ensaista não encontrou nenhuma exposição justificando a suposta impossibilidade. O que se tem são algumas colunas, mais ou menos reproduzidas com algumas semelhanças, sem exposição técnica e jurídica.
Por fim, oportunamente parece relevante mencionar, ainda, a desnecessidade de formulação de Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades de Natureza Tributária – Dirbi. Isso porque de acordo com as determinações da Instrução Normativa RFB n. 2198, de junho de 2024, no item 04, do seu anexo único, não aloca o art. 17, da lei 11.033/2004, como uma das hipóteses necessárias para o oferecimento da declaração obrigatória (Dirbi), e não trata do não estorno de crédito originado nas contribuições ao Pis e da Cofins.
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