Relativamente ao FUNRURAL, algumas notícias têm sido divulgadas de modo um pouco oscilantes e essa oscilação acarreta certa incerteza, fenômeno que se justifica em razão da complexidade do tema. Em resumo é possível fazer uma espécie de quadro geral porque, de fato, o tema é bem complexo e até mesmo os Ministros têm demonstrado certo desentendimento sobre o que está sendo analisado.
Basicamente, é preciso considerar que o FUNRURAL é uma contribuição social que tem assento no art. 195 e, antes da emenda constitucional n 20/1998, a base de cálculo era a folha de salário, o faturamento e o lucro conforme defina o inciso I com alcance para a atividade rural definida no §8º, desse mesmo dispositivo constitucional.
A lei instituidora veio logo após a promulgação da CF/1988 e instituiu com base contributiva para a seguridade social, por meio da Lei Federal 8.212/1991, em seu art. 25 originalmente atribuindo ao produtor pessoa física, ainda que empregador, igual tratamento conferido ao segurando especial. A mesma lei, no inciso IV, do art. 30, determina a figura da sub-rogação do recolhimento ao adquirente da produção.
O problema é que, antes da emenda constitucional n. 20/1998, a constituição não previa/autoriza a instituição de base contributiva sobre o faturamento do produtor pessoa física empregadora. Esse foi o motivo de muitas ações questionando a inconstitucionalidade da norma instituidora (lei 8.212/1991, art. 25), cujo desfecho foi favorável ao contribuinte porque o STF reiteradamente disse ser inconstitucional a instituição de base de cálculo sem previsão constitucional.
Um desses debates ocorreu no seio do RE 596.177, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, cujos efeitos ficaram submetidos à sistemática de repercussão geral da matéria. Nesse leading case, a Corte manteve as mesmas orientações anteriores para reconhecer a inconstitucionalidade do art. 25, da Lei Federal 8.212/1991, com redação conferida por meio da Lei Federal 8.540/1992, claramente, em razão da inexistência de lei Complementar exigida no inciso I do art. 154 e §4º, do art. 195, da CF/88.
Sem a edição de LC ou antes da EC 20/98, não havia, portanto, maiores dúvidas quanto à inconstitucionalidade dos diplomas legais editadas, nomeadamente as Leis 8.540/92; 8.870/94; 9.528/97; e 9.876/99. Isso porque não havia a inclusão da “receita” entre as fontes de custeio da Seguridade Social, com o reforço de que a figura do empregador rural pessoa física estava expressamente excluída do regime tributário especial do §8º do artigo 195 do Texto Constitucional.
Ocorre que EC 20/98 corrigiu esse ponto, de modo que, mais recentemente, o STF acolheu parcialmente uma Ação Direta de Inconstitucionalidade para sedimentar, ao fim e ao cabo, o que já era esperado: que antes da EC a base é inconstitucional, contudo, disse ser constitucional a atual redação do art. 25, da lei 8.212/91, com redação dada pela lei 10.256/2001.
Todavia, o Ministro Dias Toffoli proferiu voto divergente para reputar também inconstitucional o inciso IV, do art. 30 da lei 8.212/91, o que seria consectário lógico porque, se anteriormente o STF entendia e confirmou na atual ADI, que a base de cálculo era inconstitucional, a responsabilidade pelo recolhimento de tributo com base inconstitucional é igualmente inconstitucional.
Ao nosso ver, o STF está diante de uma situação no mínimo, embaraçosa. Isso porque a sub-rogação teve algumas alterações mediante a Lei 9.528/1997, todas antes da EC 20/98 e sem que tenha recebido qualquer tratamento após o marco temporal que permitiu a instituição de base contributiva sobre a receita sobre a venda da produção, nos casos de produtor rural pessoa física empregadora.
Neste momento, a ADI 4395, cujo objeto tem extrema relevância para a o setor de transformação de matéria prima oriunda de produção rural, além dos compradores em geral da produção de pessoa física empregadora definida no inciso I, do art. 195, da CF/88, está suspensa em razão desse “embaraço”. Vele ressaltar também, pela leitura do voto do Ministro Fachin, fica claro que, ao menos parcela da Corte, não ignora o fato de que, nos últimos anos a arrecadação oriunda do agronegócio é maior em relação aos investimentos no setor; a manutenção da sub-rogação acarreta, no entender no Ministro, chancela para esse desequilíbrio.
Estamos otimistas no sentido de que o STF reconheça a inconstitucionalidade da sub-rogação, até porque, não haverá diminuição de receita. À rigor, a contribuição deverá ser recolhida diretamente pelo produtor, como deveria ser. Por outro lado, diante da morosidade do STF em enfrentar esse dilema que ele mesmo criou, se esquivando de declarar a inconstitucionalidade da sub-rogação, estamos certos de que, atendidas algumas particularidades, poderá ser empregado o remédio constitucional de mandado de segurança para desobrigar o comprador de recolher a contribuição.
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